A Indústria Cultural e a globalização




A Indústria Cultural impede a formação de indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de decidir conscientemente. [2] Com as palavras do próprio Adorno, podemos compreender o porque das suas reflexões acerca desse tema.
Theodor Wiesengrund-Adorno, em parceria com outros filósofos contemporâneos, estão inseridos num trabalho muito árduo: pensar filosoficamente a realidade vigente. A realidade em que vivia estava sofrendo várias transformações, principalmente, na dimensão econômica. O Comércio tinha se fortalecido após as revoluções industriais, ocorridas na Europa e, com isso, o Capitalismo havia se fortalecido definitivamente, principalmente, com as novas descobertas cientificas e, conseqüentemente, com o avanço tecnológico. O homem havia perdido a sua autonomia. Em conseqüência disso, a humanidade estava cada vez mais se tornando desumanizada. Em outras palavras, poderíamos dizer que o nosso caro filósofo contemplava uma geração de homens doentes, talvez gravemente. O domínio da razão humana, que no Iluminismo era como uma doutrina, passou a dar lugar para o domínio da razão técnica.  Os valores humanos haviam sido deixados de lado em troca do interesse econômico. O que passou a reger a sociedade foi a lei do mercado, e com isso, quem conseguisse acompanhar esse ritmo e essa ideologia de vida, talvez, conseguiria sobreviver; aquele que não conseguisse acompanhar esse ritmo e essa ideologia de vida ficava a mercê dos dias e do tempo, isto é, seria jogado à margem da sociedade. Nessa corrida pelo ter, nasce o individualismo, que, segundo o nosso filósofo, é o fruto de toda essa Indústria Cultural. Segundo Adorno, na Indústria Cultural, tudo se torna negócio. Enquanto negócios, seus fins comerciais são realizados por meio de sistemática e programada exploração de bens considerados culturais.  Um exemplo disso, dirá ele, é o cinema. O que antes era um mecanismo de lazer, ou seja, uma arte, agora se tornou um meio eficaz de manipulação. Portanto, podemos dizer que a Indústria Cultural traz consigo todos os elementos característicos do mundo industrial moderno e nele exerce um papel especifico, qual seja, o de portadora da ideologia dominante, a qual outorga sentido a todo o sistema. É importante salientar que, para Adorno, o homem, nessa Indústria Cultural, não passa de mero instrumento de trabalho e de consumo, ou seja, objeto. O homem é tão bem manipulado e ideologizado que até mesmo o seu lazer se torna uma extensão do trabalho. Portanto, o homem ganha um coração-máquina. Tudo que ele fará, fará segundo o seu coração-máquina, isto é, segundo a ideologia dominante. A Indústria Cultura, que tem com guia a racionalidade técnica esclarecida, prepara as mentes para um esquematismo que é oferecido pela indústria da cultura – que aparece para os seus usuários como um “conselho de quem entende”. O consumidor não precisa se dar ao trabalho de pensar, é só escolher. É a lógica do clichê. Esquemas prontos que podem ser empregados indiscriminadamente só tendo como única condição a aplicação ao fim a que se destinam. Nada escapa a voracidade da Indústria Cultural. Toda vida torna-se replicante. Dizem os autores: Ultrapassando de longe o teatro de ilusões, o filme não deixa mais à fantasia e ao pensamento dos espectadores nenhuma dimensão na qual estes possam, sem perder o fio, passear e divagar no quadro da obra fílmica permanecendo, no entanto, livres do controle de seus dados exatos, e é assim precisamente que o filme adestra o espectador entregue a ele para se identificar imediatamente com a realidade. Atualmente, a atrofia da imaginação e da espontaneidade do consumidor cultural não precisa ser reduzida a mecanismos psicológicos. Os próprios produtos (...) paralisam essas capacidade em virtude de sua própria constituição objetiva(ADORNO & HORKHEIMER, 1997:119).
Fica claro portanto a grande intenção da Indústria Cultural: obscurecer a percepção de todas as pessoas, principalmente, daqueles que são formadores de opinião. Ela é a própria ideologia.  Os valores passam a ser regidos por ela. Até mesmo a felicidade do individuo é influenciada e condicionada por essa cultura. Na Dialética do Esclarecimento, Adorno e Horkheimer exemplificam este fato através do episódio das Sereias da epopéia homérica. Ulisses preocupado com o encantamento produzido pelo canto das sereias tampa com cera os ouvidos da tripulação de sua nau. Ao mesmo tempo, o comandante Ulisses, ordena que o amarrem ao mastro para que, mesmo ouvindo o cântico sedutor, possa enfrentá-lo sem sucumbir à tentação das sereias. Assim, a respeito de Ulisses, dizem os autores:  O escutado não tem conseqüências para ele que pode apenas acenar com a cabeça para que o soltem, porém tarde demais: os companheiros, que não podem escutar, sabem apenas do perigo do canto, não da sua beleza, e deixam-no atado ao mastro para salvar a ele e a si próprios. Eles reproduzem a vida do opressor ao mesmo tempo que a sua própria vida e ele não pode mais fugir a seu papel social. Os vínculos pelos quais ele é irrevogavelmente acorrentado à práxis ao mesmo tempo guardam as sereias à distância da práxis: sua tentação é neutralizada em puro objeto de contemplação, em arte. O acorrentado assiste a um concerto escutando imóvel, como fará o público de um concerto, e seu grito apaixonado pela liberação perde-se num aplauso. Assim o prazer artístico e o trabalho manual se separam na despedida do antemundo. A epopéia já contém a teoria correta. Os bens culturais estão em exata correlação com o trabalho comandado e os dois se fundamentam na inelutável coação à dominação social sobre a natureza (ADORNO & HORKHEIMER, 1997:45).  É importante frisar que a grande força da Indústria Cultural se verifica em proporcionar ao homem necessidades. Mas, não aquelas necessidades básicas para se viver dignamente (casa, comida, lazer, educação, e assim por diante) e, sim, as necessidades do sistema vigente (consumir incessantemente). Com isso, o consumidor viverá sempre insatisfeito, querendo, constantemente, consumir e o campo de consumo se torna cada vez maior. Tal dominação, como diz Max Jimeenez, comentador de Adorno, tem sua mola motora no desejo de posse constantemente renovado pelo progresso técnico e científico, e sabiamente controlado pela Indústria Cultural. Nesse sentido, o universo social, além de configurar-se como um universo de “coisas” constituiria um espaço hermeticamente fechado. E, assim, todas as tentativas de se livrar desse engodo estão condenadas ao fracasso. Mas, a visão “pessimista” da realidade é passada pela ideologia dominando, e não por Adorno. Para ele, existe uma saída, e esta, encontra-se na própria cultura do homem: a limitação do sistema e a estética. Na Teoria Estética, obra que Adorno tentará explanar seus pensamentos sobre a salvação do homem, dirá ele que não adiante combater o mal com o próprio mal. Exemplo disso, ocorreram no nazismo e em outras guerras. Segundo ele, a antítese mais viável da sociedade selvagem é a arte. A arte, para ele, é que liberta o homem das amarras dos sistemas e o coloca com um ser autônomo, e, portanto, um ser humano. Enquanto para a Indústria Cultural o homem é mero objeto de trabalho e consumo, na arte é um ser livre para pensar, sentir e agir. A arte é como se fosse algo perfeito diante da realidade imperfeita. Além disso, para Adorno, a Indústria Cultural não pode ser pensada de maneira absoluta: ela possui uma origem histórica e, portanto,  pode desaparecer. Por fim, podemos dizer que Adorno foi um filósofo que conseguiu interpretar o mundo em que viveu, sem cair num pessimismo. Ele pôde vivenciar e apreender as amarras da ideologia vigente, encontrando dentro dela o próprio antídoto: a arte e a limitação da própria Indústria Cultural. Portanto, os remédios contra as imperfeições humanas estão inseridos na própria história da humanidade. É preciso que esses remédios cheguem a consciência de todos (a filosofia tem essa finalidade), pois, só assim, é que conseguiremos um mundo humano e sadio.
 Por Daniel Ribeiro da Silva
EXERCICIOS
  1. UEL 2013.
  1. UEL 2013. Leia o texto a seguir.
O modo de comportamento perceptivo, através do qual se prepara o esquecer e o rápido recordar da música de massas, é desconcentração. Se os produtos normalizados e irremediavelmente semelhantes entre si, exceto certas particularidades surpreendentes, não permitem uma audição concentrada, sem se tornarem insuportáveis para os ouvintes, estes, por sua vez, já não são absolutamente capazes de uma audição concentrada. Não conseguem manter a tensão de uma concentração atenta, e por isso se entregam resignadamente àquilo que acontece e flui acima deles, e com o qual fazem amizade somente porque já o ouvem sem atenção excessiva.
(ADORNO, T. W. O fetichismo na música e a regressão da audição. In: Adorno et all. Textos escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p.190. Coleção Os Pensadores.)
As redes sociais têm divulgado músicas de fácil memorização e com forte apelo à cultura de massa.
A respeito do tema da regressão da audição na Indústria Cultural e da relação entre arte e sociedade em Adorno,assinale a alternativa correta.
a) A impossibilidade de uma audição concentrada e de uma concentração atenta relaciona-se ao fato de que a música tornou-se um produto de consumo, encobrindo seu poder crítico.
b) A música representa um domínio particular, quase autônomo, das produções sociais, pois se baseia no livre jogo da imaginação, o que impossibilita estabelecer um vínculo entre arte e sociedade.
c) A música de massa caracteriza-se pela capacidade de manifestar criticamente conteúdos racionais expressos no modo típico do comportamento perceptivo inato às massas.
d) A tensão resultante da concentração requerida para a apreciação da música é uma exigência extramusical, pois nossa sensibilidade é naturalmente mais próxima da desconcentração.
e) Audição concentrada significa a capacidade de apreender e de repetir os elementos que constituem a música, sendo a facilidade da repetição o que concede poder crítico à música.
3. Leia o texto de Adorno a seguir.
            Se as duas esferas da música se movem na unidade da sua contradição recíproca, a linha de demarcação que as separa é variável. A produção musical avançada se independentizou do consumo. O resto da música séria é submetido à lei do consumo, pelo preço de seu conteúdo. Ouve-se tal música séria como se consome uma mercadoria adquirida no mercado. Carecem totalmente de significado real as distinções entre a audição da música “clássica” oficial e da música ligeira.
(ADORNO, T. W. O fetichismo na música e a regressão da audição. In: BENJAMIN, W. et all. Textos escolhidos. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1987. p. 84.)
Com base no texto e nos conhecimentos sobre o pensamento de Adorno, é correto afirmar:
a) A música séria e a música ligeira são essencialmente críticas à sociedade de consumo e à indústria cultural.   
b) Ao se tornarem autônomas e independentes do consumo, a música séria e a música ligeira passam a realçar o seu valor de uso em detrimento do valor de troca.   
c) A indústria cultural acabou preparando a sua própria autorreflexividade ao transformar a música ligeira e a séria em mercadorias.   
d) Tanto a música séria quanto a ligeira foram transformadas em mercadoria com o avanço da produção industrial.   
e) As esferas da música séria e da ligeira são separadas e nada possuem em comum.   
4. Texto
“Se você é o que você come, e consome comida industrializada, você é milho”, escreveu Michael Pollan no livro O Dilema do Onívoro, lançado este ano no Brasil. Ele estima que 25% da comida industrializada nos EUA contenha milho de alguma forma: do refrigerante, passando pelo Ketchup, até as batatas fritas de uma importante cadeia de fast food – isso se não contarmos vacas e galinhas que são alimentadas quase exclusivamente com o grão.
O milho foi escolhido como bola da vez ao seu baixo preço no mercado e também porque os EUA produzem mais da metade do milho distribuído no mundo.
(Adaptado: BURGOS, P. Show do milhão: milho na comida agora vira combustível. Super Interessante. Edição 247, 15 dez. 2007, p.33.)
Com base no texto e nos conhecimentos sobre o desenvolvimento do capitalismo e a indústria cultural, considere as afirmativas.
I. O capitalismo contemporâneo tornou a globalização um fenômeno que intensificou a padronização e a homogeneização como formas de reprodução técnica criadas a partir da revolução industrial.
II. A abertura comercial dos portos das colônias americanas resultou no cercamento dos campos, facilitando o comércio pelo acúmulo de capitais e, em consequência, a revolução industrial.
III. A crítica filosófica à instrumentalização cultural constata que o predomínio da racionalidade técnica permitiu o resgate do potencial emancipatório da razão sonhado pelo projeto iluminista.
IV. Com o avanço tecnológico, a racionalidade técnica penetra todos os aspectos da vida cotidiana, subjugando o homem a um processo de instrumentalização cultural e homogenização de comportamentos.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.   
b) Somente as afirmativas I e IV são corretas.   
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.   
d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas.   
e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas.   
5.  Com base no pensamento estético de Adorno e Benjamin, considere as afirmativas a seguir.
I. Apesar de terem o mesmo ponto de partida, a saber, a análise crítica das técnicas de reprodução, Adorno e Benjamin chegam a conclusões distintas. Adorno entende que a reprodutibilidade das obras de arte é algo negativo, pois transforma esta última em mercadoria; para Benjamin, apesar de a reprodutibilidade ter aspectos negativos, uma forma de arte como o cinema pode ser usada potencialmente em favor da classe operária.
II. Para Adorno, o discurso revolucionário na arte torna esta forma de expressão humana instrumentalista, e isto significa abolir a própria arte. Por seu turno, Benjamin considerava que os novos meios de comunicação não deveriam ser substituídos, mas sim transformados ou subvertidos segundo os interesses da comunicação burguesa.
III. Para Adorno, a noção de aura na obra de arte preservava a consciência de que a realidade poderia ser melhor, mas o processo de massificação da arte dissolveu tal noção e, com ela, a dimensão critica da arte. Para Benjamin, a perda da aura destruiu a unicidade e a singularidade da obra de arte, que perde o seu valor de culto e se torna acessível.
IV. Adorno vê positivamente a reprodutibilidade da arte, já que a obra de arte se transforma em mercadoria padronizada que possibilita a todos o acesso e o desenvolvimento do gosto estético autônomo; para Benjamin, a reprodução tem como dimensão negativa essencial o fato de impossibilitar às massas o acesso às obras.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.   
b) Somente as afirmativas I e III são corretas.   
c) Somente as afirmativas II e IV são corretas.   
d) Somente as afirmativas I, III e IV são corretas.   
e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas.   
  GABARITO
1SALA 2A 3D 4 B 5 B

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